A operação Calvário e o recuo do mar

A manhã do dia 30 de abril deste ano foi muito movimentada na área política/policial. Naquele dia foi presa a servidora lotada na Procuradoria-Geral do Estado, Maria Laura Caldas de Almeida Carneiro. Ela foi apontada por delatores como arrecadadora de propinas destinadas por empresas a autoridades na Paraíba.

Ao todo, naquela data, foram cumpridos 18 mandados de busca e apreensão, tendo o já ex-procurador-geral do Estado, Gilberto Carneiro, como um dos alvos. Até então, a operação Calvário, coordenada pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), do Ministério Público, atuava com ritmo alucinante de em média uma operação a cada quinze dias. Passados dois meses da última, muitos se perguntam se acabou. Mas é melhor não apostar nisso.

Entre advogados com atuação no caso, políticos e jornalistas, pelo menos os mais sóbrios, tem reinado a tese de recuo do mar. O fenômeno, registrado em várias partes do planeta, precede os tsunamis. A diferença é que no caso do fenômeno natural, quem está no caminho, ao ser alertado, consegue fugir e se salvar. No caso em tela, a coisa não é bem assim.

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Muita gente poderosa acabou indo parar atrás das grades desde o início da operação e o escândalo de corrupção envolvendo a Cruz Vermelha Brasileira filial Rio Grande do Sul ganhou claridade solar. Antes, havia apenas relatórios de auditoria dos Tribunais de Contas do Estado e da União apontando esquema pesado de desvio de recursos. Eram indícios de superfaturamento, não comprovação de gastos e pagamentos a autoridades – todos varridos para baixo do tapete.

A história começou a ser desnudada no dia 14 de dezembro do ano passado, quando a operação foi para as ruas. Naquele momento, 11 dirigentes da Cruz Vermelha foram presos, entre eles o mandatário da entidade, Daniel Gomes da Silva. Em João Pessoa, naquela ação desencadeada a partir do Rio de Janeiro, foi preso o empresário Roberto Calmon.

O blog teve acesso à denúncia protocolada pelo Gaeco do Rio e lá estava descrito um esquema comandado por Daniel, com pagamento de propinas a autoridades. No organograma, logo abaixo de Daniel aparece Michelle Cardoso. Lembram dela? A secretária de Daniel continua presa e foi responsável pela entrega de uma “caixa de vinho” ao então servidor da Secretaria de Administração da Paraíba, Leandro Nunes. Lá estariam quase R$ 900 mil, segundo confissão dele.

No organograma, abaixo de Michelle, aparecem as secretarias de Administração da Paraíba (SEA-PB), Estadual de Saúde do Rio (SES-RJ) e Municipal de Saúde do Rio (SMS-RJ). Da Paraíba, além de Leandro, foram presos a então secretária de Administração, Livânia Farias, e ainda Maria Laura. Todos pediram exoneração ou foram exonerados pelo governador João Azevêdo (PSB). Houve mandados de busca e apreensão nas casas de Gilberto Carneiro e do ex-secretário de Planejamento e Gestão do Estado, Waldson de Souza. Todos eram próximos ao ex-governador Ricardo Coutinho (PSB).

A Cruz Vermelha, junto com o Instituto de Psicologia Clínica Educacional e Profissional (IPCEP), administraram R$ 1,1 bilhão entre 2011 e 2018. A primeira foi descredenciada pelo governo e deixa o Hospital de Trauma nesta segunda-feira (1º).

Dos suspeitos presos na Paraíba, Leandro e Livânia fizeram colaboração premiada. Corre nos bastidores a informação de que a de Maria Laura estaria nos ¨finalmentes¨ e tudo leva a crer que Daniel Gomes segue no mesmo caminho.

A Cruz Vermelha chegou à Paraíba no primeiro ano de mandato de Ricardo Coutinho, meses após o tio de Daniel, que mora em Portugal e sem contato nenhum com o Estado, ter feito doação para a campanha socialista. Foram R$ 300 mil para a pleito de 2010, por meio de doação oficial. Ou seja, as irregularidades denunciadas foram muitas e a cada dia novos fatos se juntam ao que foi delatado pelas testemunhas.

O intervalo entre as operações, por isso, não significa arrefecimento. Quer dizer apenas que o mar está recuando e só Deus consegue prever com que força as águas vão retornar.

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